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Assessoria jurídica da ANEC produz parecer sobre passaporte vacinal

27/01/2022
Por  ANEC Comunicação

A Associação Nacional de Educação Católica do Brasil (ANEC) realizou consulta à assessoria jurídica, Sarubbi Cysneiros Advogados Associados, a fim de obter esclarecimentos acerca da possibilidade de instituições de ensino privadas exigirem passaporte vacinal de seus alunos. Sobre o tema, a equipe produziu o parecer abaixo. 

A exigência de comprovação da vacina como condicionante para o retorno às aulas vem sendo objeto de várias discussões, sobretudo porque traz repercussões que perpassam a ponderação de direitos constitucionalmente protegidos como, por exemplo, o direito à educação, o direito à locomoção e o direito à saúde. Estamos, portanto, diante de um nítido conflito de direitos de ordem constitucional e, especificamente sobre a hipótese da consulta, ainda não há manifestação definitiva do Supremo Tribunal Federal (STF), seja em sede de decisão monocrática (proferida de forma liminar por apenas um ministro), seja pelo colegiado da Corte.

Assim, toda e qualquer opinião jurídica sobre o tema passa pela análise desse conflito de interesses e, naturalmente, pode ser objeto de decisão final em sentido diverso pelo STF em razão da controvérsia do debate. Ainda assim, tenta-se aqui elucidar a questão, de modo a proferir uma opinião estritamente técnica sobre o tema, no intuito de orientar a ANEC e associadas da melhor forma.

É fato que a Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, em seu art. 3º, fixa que o Estado pode determinar a vacinação compulsória para enfrentamento da emergência sanitária pandêmica. Obrigatório, entretanto, é entender como isso se traduz na vida prática, em especial à luz da interpretação já dada sobre tal hipótese pelo STF. 

Diante da diversidade de conceitos que a problemática envolve, cumpre esclarecer inicialmente que, embora a legislação sanitária preveja a possibilidade de adotar medidas compulsórias para combate e prevenção do coronavírus, não se trata de ato forçado, visto que é necessário haver o consentimento da pessoa vacinada. A compulsoriedade se dá através da adoção de medidas indiretas como a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares. Esta foi, inclusive, a linha da decisão do STF no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6.586 e 6.587. Julgamos importante transcrever o dispositivo da decisão, pois ele é bastante claro e útil para sanar dúvidas e interpretações que muitas vezes são veiculadas de forma distorcida:

ADIs conhecidas e julgadas parcialmente procedentes para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 3o, III, d, da Lei 13.979/2020, de maneira a estabelecer que: (A) a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e (i) tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes, (ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes, (iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas; (iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, e (v) sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente; e (B) tais medidas, com as limitações expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência.” (grifos nossos)

 

Foi no contexto dessa discussão que o Ministério da Educação (MEC), em 29 de dezembro de 2021, publicou ato no qual afirmou que o comprovante de vacinação contra covid-19 não poderia ser condicionante para a retomada das atividades presenciais nas Instituições de Ensino Superior Federais, seguindo o entendimento do Parecer emitido pela Advocacia-Geral da União (AGU).

Para o MEC, a exigência só poderia ser feita por meio de uma lei federal específica, visto que as universidades e instituições de ensino federais fazem parte da Administração Pública Federal. 

Nesse panorama, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, suspendeu o ato do Ministério da Educação que proibiu a exigência de comprovação de vacinação, sob o argumento de que as instituições têm autonomia universitária e podem exigir o comprovante . Importante destacar que se trata de decisão monocrática proferida pelo relator e pode ser revista, tanto por ele, quanto pelo órgão colegiado da Corte.  

Tal decisão gerou um questionamento se toda e qualquer instituição de ensino, inclusive a privada, poderia, então, exigir o passaporte vacinal para ingresso dos alunos, dúvida motivadora da consulta da ANEC a esta banca de advogados.

No nosso sentir, é inviável concluir pela possibilidade de que instituições de ensino privadas possam ter tal autonomia, por dois motivos. Primeiro porque a decisão que suspendeu o ato do Ministro da Educação foi proferida em ADPF que versa sobre a autonomia da gestão de universidades federais, eis que o ato do Ministro versava igualmente sobre a proibição de se exigir o passaporte vacinal em tais universidades públicas. Segundo porque não fica claro na decisão sequer se a autonomia do gestor da Universidade supera a competência do município ou estado onde se encontra IES federal. 

Se há dúvida quanto à autonomia de Reitores de Universidades Federais para definir sobre esse tipo exigência quando não há lei específica local que a impõe, esta dúvida na nossa opinião – salvo melhor juízo – não existe quando se trata de instituições de ensino privadas, pois estas, como outra instituição privada qualquer, não pode definir as exigências sanitárias de modo a impedir o acesso à educação, quando o próprio Estado, para aquela localidade, avaliando tecnicamente a situação, entendeu ser descabível tal controle.

Desse modo, cabe às instituições de ensino privadas observarem as orientações emitidas pelas autoridades públicas com competência territorial que alcançam o seu local de atividade, tal como ocorreu no ano passado quando Governadores e Prefeitos decidiram acerca da suspensão das aulas presenciais nas instituições de ensino submetidas ao seu controle. 

Ressalvando mais uma vez a controvérsia do tema e respeitando eventuais opiniões divergentes, essa é a opinião desta assessoria jurídica.


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