A educação domiciliar ou homeschooling, como está sendo chamada, tem tudo para ser motivo de grandes brigas na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) nas próximas semanas. Isto porque a Casa tem três propostas polêmicas sobre o tema, que serão apensadas em um único texto e começam a tramitar com maior velocidade. O caso remete a manifestações diversas, críticas e divergências por parte de parlamentares, educadores, entidades de ensino, sindicatos e pais de alunos.
As propostas que estão na CLDF são três, uma apresentada pela deputada Júlia Lucy (Novo), outra de autoria do deputado João Cardoso (Avante) e uma terceira, enviada à Casa pelo Executivo. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça da CLDF, Reginaldo Sardinha (Avante), pediu para que na próxima reunião, ainda em data definida, ele seja o relator das proposições naquele colegiado.
Só a menção ao tema já suscitou discussões na comissão. O deputado Reginaldo Veras (PDT), que também é professor, pediu que os projetos sejam votados mais adiante e não de imediato pelo fato de serem, segundo ele, defendidos apenas por uma parcela reduzida da população.
Caberá ao Executivo definir os períodos e critérios de avaliação dos alunos, bem como determinar regras de fiscalização da qualidade do ensino para as crianças e adolescentes inscritos nesse modelo. A proposta também determina que pais, mães e responsáveis para serem cadastrados precisarão ter aptidão técnica para ministrar atividades pedagógicas ou poderão contratar profissional capacitado, conforme exigências determinadas. E prevê o registro de Entidades de Apoio à Educação Domiciliar (EAED), para dar suporte às aulas ministradas em casa.
Entre os parlamentares o debate já começou. Na última semana, o deputado Reginaldo Veras afirmou que o GDF não soube tocar a educação à distância durante o período de isolamento social e, apesar do conhecimento prévio dos professores locais na modalidade, foi incapaz de levar o ensino remoto para a maior parte dos estudantes do DF, motivo pelo qual não acha que será bem sucedido este modelo educacional. Disse, ainda, que o ensino domiciliar precisa ser muito bem debatido e não votado de forma açodada.
A deputada Júlia Lucy (Novo), autora de uma das propostas, é da opinião que a legalização do homeschooling é importantíssima. “Trata-se de uma pauta que merece toda a atenção dos defensores da liberdade. Precisamos dar às famílias liberdade para educar, estudar e aprender”, afirmou.
O distrital João Cardoso, autor de outro dos projetos, lembrou que o homeschooling obteve resultados positivos em diversos países, como Alemanha, Inglaterra, Espanha e França. “Ignorar, portanto, a experiência, seja por preconceito ou em decorrência de algum dispositivo legal específico, é manter-se fora do universo das novas tecnologias e da nova pedagogia”, ressaltou.
A Associação Nacional de Educação Católica do Brasil (Anec), uma das primeiras entidades a se manifestar contrária a projeto do GDF, encaminhou ofício ao presidente da CLDF com críticas no âmbito legal e pedagógico.
Para a entidade, “a educação precisa ser desenvolvida em um ambiente escolar porque somente assim, na interação com os outros, é possível que as infâncias e juventudes desenvolvam suas habilidades e competências socioemocionais e suas competências cognitivas, requeridas para o sucesso pessoal e social os estudantes. No texto, a Anec ressalta ainda que “a escola é o espaço privilegiado de construção de oportunidades igualitárias para novas aprendizagem”.
Segundo Hugo Cysneiros, advogado da Anec, a decisão pegou todos de surpresa. “A falta de debate sobre o tema com organizações de Ensino e a sociedade é um dos pontos de insatisfação. Não houve qualquer tipo de discussão prévia com ninguém, sobre nenhum dos temas, sequer sobre a feitura do texto”, reclamou.
A ordem de tramitação e votação também é criticada. Para Cysneiros, nada justifica a pressa em uma possível aprovação do projeto. “A questão é: educar os filhos em casa não é um direito que os pais têm. Isso deveria ser uma possibilidade jurídica prevista em lei federal. Essa possibilidade não existe. Não há como regulamentar algo que não existe”, disse o advogado.
O Sindicato dos Professores no Distrito Federal (Sinpro) também emitiu nota contra a proposta. No documento, a entidade destacou que além de representar repercussões diretas e graves para milhares de estudantes e professores, a medida “vislumbra a perda do convívio social e escolar; prejudica e ignora a proteção integral de crianças, adolescentes e das demais políticas sociais atreladas à educação escolar; e afeta o ambiente escolar, fundamental para o desenvolvimento infantil”.
O Sinpro lembrou que alguns municípios tentaram aprovar projetos de lei nesta linha, mas não houve amparo legal para a aprovação, uma vez que o ensino domiciliar não tem lei federal que ampare sua aprovação.
De acordo com a Secretaria de Assuntos Jurídicos do sindicato, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o caso é no sentido de que projetos que abordem ensino domiciliar precisam ter amparo em uma lei federal. E como no Distrito Federal não existe uma lei que sancione o projeto apresentado pelo GDF, uma vez que esta é uma prerrogativa do Congresso Nacional, projetos do tipo devem ser considerados inconstitucionais.
Entre os pais de alunos também há divisão sobre a matéria. É o caso, por exemplo, da biomédica Ravena Maia e do empresário Ricardo Nakamura. No caso de Ravena, ela é contra o projeto. Mãe de Arthur, de 5 anos, a biomédica destacou os pontos em que acredita que apenas o ambiente escolar proporciona benefícios únicos.
Segundo ela, além de profissionais qualificados, a convivência com outras crianças é um ponto que faz não gostar da medida. “O ambiente escolar permite que o estudante saiba conviver com as diferenças e crie uma base de amizades, a formulação de ideias a partir do social”, opinou.
Já Ricardo Shoji Mikai Nakamura é dono de uma escola de música e pratica o ensino domiciliar há dois anos com as filhas de oito, seis e dois anos de idade. Para Ricardo, a decisão dessa forma de ensino foi adotada por uma questão filosófica.
Ele acredita que a prática, em primeiro lugar, dá liberdade aos pais para repassarem valores que julgam importantes aos filhos. Além disso, considera que o atual modelo pode ser questionado. “Hoje em dia vejo que o principal objetivo dos colégios é passar no vestibular. Esse objetivo, a meu ver, é muito pobre. A educação é mais do que isso”, ressaltou.
Fonte: Jornal Brasília
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