A presidência da Rede Eclesial Pan-Amazônica/REPAM lançou na manhã deste sábado, 26, uma mensagem final sobre o Sínodo Amazônico. Assinado pelo presidente, cardeal Cláudio Hummes, pelo vice-presidente, o cardeal Pedro Barreto, e pelo secretário executivo, Maurício López, o texto destaca alguns dos pontos importantes que foram discutidos na assembleia de Roma, retomando o processo realizado ao longo de quase dois anos, e aponta alguns caminhos a partir da Assembleia Sinodal.
Confira o texto na íntegra:
A ESPERANÇA NESTA NAVEGAÇÃO PELAS ÁGUAS DO RIO SINODAL AMAZÔNICO: FONTE DE VIDA, CONVERSÃO E ORIENTAÇÃO PARA NOVOS CAMINHOS PARA A IGREJA DIANTE DE UM MUNDO EM CRISE SOCIOAMBIENTAL
Sínodo Especial para a Região Amazônica.
Roma, Outubro de 2019
I. Nossa esperança no Cristo encarnado na Amazônia e nos novos caminhos:
A experiência de conversão eclesial trazida pela “periferia” da Amazônia e de seus povos produziu o caminho de novidade sinodal que SEGUE e que ainda está em processo, ajudando o centro a ser reformado. Portanto, devemos trabalhar intensamente, e juntos (as), para continuar navegando nessas águas vivas de diversidade cultural e do compromisso de cuidar da nossa casa comum para criar um amanhã melhor (o Reino para o qual Cristo nos chama a trabalhar) diante de uma Amazônia e de um mundo que ainda está em chamas materiais e existenciais por conta das injustiças e desejos de acumulações. É tempo de mudança, o momento é agora e será por meio da sinodalidade.
II. O caminho da nossa navegação:
A) a origem histórica do Sínodo, que evidentemente se encontra no caminho do Concílio Vaticano II, em que somos uma Igreja que se abre, de forma progressiva mas sem renunciar ao mundo e a seus gritos e esperanças, fazendo uma opção firme de ser um sinal de vida e irmã de caminhada na realidade do mundo atual. Uma igreja sempre em reforma.
B) o caminho do Magistério da Igreja na América Latina (Medellín 1968; Puebla 1979; Santo Domingo 1992; Aparecida 2007), que fez uma opção preferencial pelos pobres, pelo diálogo com as culturas, pelo reconhecimento de seu chamado à evangelização no respeito às identidades e iluminando a presença de Deus já viva e presente nas povos, e em sua definição de caminhos de discipulado missionário com opção e preferência pela Amazônia como território sociocultural e pelos seus povos e comunidades. Uma Igreja que descobre sua vocação e missão a partir da vida dos povos e também em seu próprio caminho.
C) Os testemunhos de incontáveis mulheres e homens mártires da Amazônia, que mostram a força viva do caminho da entrega para serem sementes a serem plantadas no coração dos povos, na opção pela justiça sendo vida, e vida em abundância para eles. Nesse mesmo sentido, tantos profetas, conhecidos e anônimos, que deram suas vidas por opções particulares, institucionais, de rede, sendo leigos, leigas, missionários, missioárias, religiosas, religiosos, sacerdotes, bispos, entre tantos outros que abriram seus corações para dar vida a esse acontecimento sinodal. Estes testemunhos continuarão sendo levados adiante, ainda mais além desse momento conjuntural e muito importante de Assembleia.
D) A Rede Eclesial Pan Amazônica – REPAM, que nasceu como a confluência de tantas águas vivas e serviu como ponto de encontro, também serviu incansavelmente para que as forças essenciais, porém frágeis e dispersas da Amazônia, pudessem se reunir para responder a esse sistema que descarta, mata e que já não pode mais continuar. Como REPAM, estamos aprendendo e tecendo progressivamente uma sinodalidade que serviu para chegar a este Sínodo, sobretudo em relação à escuta atenta às vozes do território.
Aprendemos a servir de ponte para que muitas pessoas se descubram como uma parte essencial deste Sínodo, dentro e fora da aula sinodal, todos no mesmo espírito que busca criar novas possibilidades para respondermos juntos para nos tornarmos a verdadeira presença que opta pela vida, neste mundo em pedaços, em profunda crise ambiental, da democracia, da rejeição do diferente. Mesmo com as consequências que isso traz, de confrontar e incomodar os poderes que neste mundo desejam servir aos interesses malignos de destruição e morte.
E) A vida dos povos indígenas em geral, e das mulheres em particular, que deram um tom totalmente diferente, mais vivo, renovado e corajoso a este Sínodo. Sua clareza, o testemunho de vida deles, a conexão espiritual com a Amazônia e seu corajoso grito por mudanças já, sua vontade de serem aliados, de responderem diante da urgência e de caminharem com o Papa, deixaram uma marca inapagável neste Sínodo. Tenho certeza de que esta marca permanecerá no coração do Papa, de toda a Igreja e daqueles que participaram neste Sínodo como símbolo da presença da força viva de Deus entre nós. A voz de uma mulher, intercultural e com dedicação corajosa pela vida até às últimas consequências, embora ainda tenhamos um longo caminho a percorrer como Igreja para dar a essas vozes o merecido alcance.
F) e, acima de tudo, saber que o SÍNODO é um PROCESSO em andamento, que é uma navegação de longo prazo e que há muito mais para continuar navegando nessas águas vivas da Amazônia, aprendendo com os povos e comunidades, fazendo sua opção inculturada e intercultural com eles, mas sabendo que o MELHOR VINHO ainda está por vir. A fase pós-assembleia do Sínodo é a mais importante. Nela, como Igreja no território, como REPAM, e com os povos e comunidades, somos os principais atores, e DEVEMOS retornar àqueles que vivem e esperam no território. Trazer de volta o que eles nos confiaram com suas vidas, esperanças, gritos e alegrias, para continuar tecendo juntos neste momento em que o mais importante começa. A fase final, que é a mais importante do Sínodo, está apenas começando agora e cabe a todos nós, juntos, levá-la adiante.
É o vinho novo que exige novos odres para que possa amadurecer aos poucos e saber que o Reino e a possibilidade de outro mundo estão ali, que devemos lutar por ele, e que a morte não tem, nem nunca terá, a última palavra. É uma verdadeira experiência a caminho da Páscoa, da ressurreição. Trata-se de assumir os fogos vivos e esperançosos de nossos povos e comunidades, que podem extinguir e sufocar os outros fogos destrutivos do desejo de acumular, do desejo de destruir, da rejeição de outros modos de vida. Devemos descobrir nos povos amazônicos, com suas próprias fragilidades, os ensinamentos para um caminho que possa nos levar a uma vida melhor e a relacionamentos mais harmoniosos com todos e com o cosmos.
III. Os Horizontes do caminho Sinodal
O Sínodo expressa 4 conversões essenciais que serão os NOVOS CAMINHOS para a reforma e a nova etapa para a Igreja na Amazônia e talvez também para a Igreja como um todo.
IV. Em comunhão e caminhando junto com nosso irmão o Papa Francisco, a Igreja e a Amazônia
Como o CAMINHO é realmente a própria EXPERIÊNCIA, e que Jesus e seu chamado a sermos co-criadores do Reino nos indicam um rumo, é importante saber que esse processo sinodal é um meio privilegiado de acompanhar o Papa Francisco. Neste caminho os povos indígenas da Amazônia chamaram o Papa: de irmão e de um deles, aquele que os entende melhor, aquele que está fazendo uma opção corajosa para defender a vida e seus territórios, seu aliado e aquele que os povos indígenas da Amazônia creem precisar de acompanhamento porque, às vezes, parece estar sozinho. A melhor maneira de navegar nestas águas com ele é assumindo os compromissos deste Sínodo, independentemente do que está no papel, ou seja, olhando o que está em nossa experiência de vida e no que dentro de nós foi transformado e trouxe renovação. São sementes oferecidas, com a certeza de que há muito por ser feito para semear na terra que preparamos, e que outros no futuro haverão de recebe-los como dom.
Reconhecendo esses novos compromissos, nos sentimos convocados a levá-los aos nossos territórios, convocados a participar e transformar nossas realidades eclesiais particulares, colocando a vidas e esperando que o Papa possa discernir tudo o que ouviu de nós durante esses dois anos (e nessas três semanas de Assembleia), para que nos devolva sua palavra e orientações na Exortação Apostólica, se possível, ou em algum outro tipo de documento, o que poderia ocorrer em março do próximo ano. Sejamos pacientes para esperar que nosso irmão Francisco nos brinde com seu ensinamentos depois de nos ouvir.
O documento final deste Sínodo será um instrumento muito importante, mas não é o documento que determinará os novos caminhos. Precisamos ter cuidado com aqueles que não querem mudar nada, que querem que as coisas acabem aqui e também cuidado com os profetas de calamidades que expressam que nada disso faz sentido, porque olham à luz de suas próprias categorias autorreferenciais. Em ambos os casos, eles se negam a ver e impedem que outros o façam, que esse é o momento preciso, um Kairós esperado que continua fluindo como um rio de água viva e que já não pode ser interrompido pelo que já foi e alcançou, o que já é e está determinado como novidade, o novo que inevitavelmente será para abrir novos horizontes do Reino.
“Com os diversos povos da Amazônia, Oh Senhor da encarnação, Jesus da entrega até a morte trágica pela injustiças de ontem e de hoje, e Cristo da certeza da vida nova na ressurreição, que saibamos reconhecer a tua verdade na diversidade de cada cultura nessas terras. Que saibamos discernir a verdade do seu chamado na voz e na vida dos povos e comunidades que vivem uma relação harmoniosa com a terra, com os outros e com a força divina ”.
Fragmento da oração de consagração do Sínodo Amazônico a São Francisco de Assis
Card. Claudio Hummes, OFM
Presidente da REPAM
Card. Pedro Barreto Jimeno, SJ
Vice-presidente da REPAM
Mauricio López O.
Secretário Executivo da REPAM
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