A ANEC preparou uma entrevista especial com o Pe. Guilherme Junior, assessor da Comissão Episcopal para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada da CNBB. Nesta conversa, ele compartilha reflexões sobre a missão e os desafios da vida consagrada no Brasil, além de destacar ações e perspectivas da Comissão na animação vocacional e no fortalecimento do serviço eclesial.
O tema do Mês Vocacional 2025, “Peregrinos porque chamados”, em sintonia com o Jubileu da Esperança, carrega um profundo significado para a experiência vocacional, especialmente quando olhamos para a juventude.
Ser “peregrino” remete à ideia de estar a caminho, em constante movimento e busca. Na perspectiva vocacional, isso recorda que a vocação não é um ponto de chegada, mas um processo dinâmico, um itinerário de fé, discernimento e amadurecimento. Todos somos chamados por Deus e, porque somos chamados, entramos em jornada — ou seja, tornamo-nos peregrinos, trilhando uma estrada de autoconhecimento, fé e serviço.
No contexto do Jubileu da Esperança, essa caminhada ganha ainda mais sentido: o Jubileu é um tempo de renovação, conversão e abertura à ação de Deus. No mundo marcado por desafios, o tema reacende nos jovens a certeza de que não caminham sozinhos: Deus vai à frente, chamando e acompanhando cada passo, renovando a esperança nos corações e impulsionando novas respostas ao Seu chamado. Assim, viver a vocação é, acima de tudo, confiar que Deus nos chama por amor e nos encoraja a semear esperança onde estivermos.
Para a juventude, isso significa assumir o protagonismo do próprio caminho vocacional: sonhar, discernir com liberdade e coragem, descobrir que a vida tem sentido e missão. Os jovens são convidados a não ter medo de se colocar a caminho, pois vocação não é apenas decisão profissional ou religiosa, mas o chamado a existir com liberdade, alegria e responsabilidade, construindo sinais do Reino de Deus no presente.
Nesse percurso, a experiência vocacional se revela como um convite para caminhar junto com outros, ouvir a voz de Deus, superar medos e incertezas, e ser sinal de esperança e renovação na Igreja e no mundo. O tema do Mês Vocacional, em 2025, é um estímulo para que a juventude descubra, no caminho de cada dia, a beleza de ser peregrino porque chamado, e de testemunhar, com esperança, a alegria do Evangelho.
2. Como o senhor percebe a importância da escola católica no despertar vocacional dos estudantes? Qual é o papel da educação na formação de pessoas abertas ao chamado de Deus?
A escola católica desempenha um papel fundamental no despertar vocacional dos estudantes, pois oferece uma formação integral que vai além do simples ensino de conteúdos acadêmicos. Ela cria um ambiente propício para o encontro com Deus e consequentemente com o próximo, em sua diversidade, valorizando cada estudante como pessoa única, dotada de dons e chamada a uma missão específica na vida.
A importância dessas instituições está, primeiramente, na partilha cotidiana de valores, como respeito, solidariedade, justiça e amor ao próximo. Por meio do testemunho de educadores, da vivência comunitária e das atividades pastorais, o estudante é continuamente convidado a refletir sobre o sentido da existência, a reconhecer e a responder ao chamado de Deus em sua história.
A educação exercida nesses espaços torna-se, portanto, uma ponte para o discernimento vocacional. Não se trata apenas de transmitir conhecimento, mas de formar pessoas abertas a Deus e ao próximo, sensíveis aos apelos do Espírito, aptas a sonhar e construir uma sociedade mais fraterna e solidária. Nesse processo, a escola propicia momentos de oração, celebrações, projetos sociais e experiências de serviço, onde cada jovem pode experimentar o amor de Deus e perceber que sua vida tem um propósito maior.
Assim, a grande missão de nossas escolas é ajudar o estudante a desenvolver não apenas suas capacidades intelectuais, mas, sobretudo, a maturidade humana e espiritual necessária para escutar a voz de Deus, discernir caminhos com liberdade e generosidade, e responder com ousadia ao chamado para ser sinal de esperança e transformação no mundo, sendo um lugar privilegiado para o despertar vocações, estimulando cada estudante a descobrir e abraçar sua missão com alegria e compromisso.
O lema deste mês vocacional 2025 nos lembra que a verdadeira esperança nasce da experiência profunda do amor de Deus em nossas vidas. No contexto escolar, especialmente dentro de uma escola católica, essa esperança vocacional pode e deve ser testemunhada através de gestos e atitudes concretas no dia a dia. Ela se manifesta quando a escola se torna um ambiente acolhedor, onde cada estudante é reconhecido e valorizado como alguém amado por Deus, com uma missão única a ser descoberta e vivida.
Ao incentivar o discernimento vocacional por meio de reflexões, rodas de conversa, projetos pastorais e momentos de espiritualidade, a escola ajuda os alunos a perceberem que sua vida tem sentido, valor e propósito. Além disso, a esperança se torna realidade quando os jovens são estimulados a colocar seus dons a serviço do próximo, especialmente através de ações solidárias e da vivência da fraternidade. O testemunho coerente dos educadores também tem um papel essencial nesse processo: ao demonstrarem fé, empatia e compromisso mesmo diante dos desafios, eles inspiram os estudantes a confiarem em Deus e a manterem viva a esperança.
Valorizar os sonhos, escutar com atenção e incentivar o protagonismo juvenil são atitudes que dizem aos jovens que acreditamos neles e no que Deus deseja realizar através de suas vidas. Assim, traduzir essa esperança vocacional no cotidiano escolar é fazer da escola um verdadeiro espaço de encontro com Deus, onde cada jovem se sente chamado a viver com alegria, coragem e responsabilidade a missão que Deus lhe confia.
O Serviço de Animação Vocacional nas escolas católicas é chamada a ser um verdadeiro espaço de acolhida e diálogo profundo com as dores e as buscas das juventudes. Mais do que realizar atividades pontuais ou eventos isolados, este serviço evangelizador precisa se tornar um itinerário permanente de escuta, significado e acompanhamento personalizado. O primeiro passo é reconhecer e dar voz às questões existenciais, angústias e sonhos dos jovens, fugindo de respostas prontas e abrindo espaços genuínos para que compartilhem suas inquietações. Isso pode acontecer por meio de rodas de conversa, projetos de vida, acompanhamento individual e atividades que promovam o autoconhecimento e a liberdade interior.
O SAV na escola ganha mais sentido quando ajuda o jovem a perceber que vocação não é apenas uma escolha profissional ou religiosa, mas expressão de quem ele é diante de Deus e do mundo – um chamado à vida plena, à realização pessoal e ao serviço ao próximo. Neste processo, é fundamental oferecer oportunidades de discernimento, desenvolvendo uma escuta ativa, empática e respeitosa, que alia evangelização e pedagogia, fortalecendo valores, virtudes e sentido de vida. O testemunho consistente de educadores e agentes de pastoral, que caminham junto, compartilham experiências e mostram sentido mesmo diante das frustrações e desafios, torna-se inspiração concreta.
Além disso, deve criar iniciativas que promovam o protagonismo juvenil, valorizando seus dons, talentos e sonhos, e mostrando que cada trajetória, mesmo com dúvidas e quedas, pode ser transformada em fonte de esperança e missão. Ao integrar projetos de solidariedade, ações comunitárias e momentos de espiritualidade à rotina escolar, deve-se perceber e dialogar com o desejo genuíno de fazer diferença e encontrar um propósito maior, mostrando que o amor de Deus – derramado em nossos corações – é fonte inesgotável de esperança e caminho aberto para todos.
É preciso ajudar a juventude a reencontrar sentido mesmo nas perguntas sem resposta, reconectando-se com o chamado amoroso de Deus, criando comunidades escolares marcadas pela solidariedade, pela escuta e pela coragem de recomeçar, sempre.
Muitas vezes, de fato, a ideia de vocação é compreendida de maneira restrita, limitada ao ministério ordenado ou à vida consagrada. Para ampliar essa visão entre estudantes e educadores, sem deixar de valorizar o chamado específico à vida consagrada e ministerial, é fundamental resgatar o sentido original e amplo da vocação cristã: toda pessoa é chamada, em primeiro lugar, à vida, ao amor e à santidade, seja qual for o caminho que escolher trilhar.
Esse processo começa promovendo o diálogo e a reflexão sobre os diversos modos de responder ao chamado de Deus, ajudando a perceber que a vocação abrange todas as dimensões da existência: familiar, profissional, social, laical e religiosa. É importante inserir na rotina escolar testemunhos variados, momentos de escuta e partilha, para que estudantes possam conhecer histórias de leigos engajados, professores, profissionais comprometidos, casais, jovens missionários e, claro, consagrados e presbíteros. Assim, torna-se evidente que vocação é o chamado a viver plenamente, colocando os próprios dons a serviço da construção de um mundo melhor, em qualquer estado de vida.
Ao mesmo tempo, é valioso ressaltar o lugar especial da vida consagrada e do ministério ordenado, mostrando a beleza, o sentido profundo e a atualidade desses caminhos. Valorizar esses testemunhos, apresentar o presbiterado e a consagração como respostas generosas ao amor de Deus sem, contudo, desvalorizar outras formas de servir, permite que a comunidade escolar reconheça e respeite cada chamado.
O papel dos educadores nesse processo é fundamental: através da escuta, do incentivo ao discernimento e do respeito às escolhas pessoais, colaboram para que cada jovem acredite ser possível encontrar um sentido maior para sua vida. Dessa forma, amplia-se a compreensão de vocação sem perder a força desses chamados específicos, tornando a escola um ambiente de liberdade, esperança e abertura a todas as formas de viver o chamado de Deus.
A afirmação do Papa Francisco de que “toda pastoral é vocacional” traz uma luz nova e transformadora para a missão educativa das escolas católicas. Essa visão amplia o conceito de vocação, afastando-o da ideia de algo restrito a escolhas religiosas específicas, e aproximando-o do cotidiano de cada pessoa que busca viver com sentido, escuta interior e abertura à ação de Deus. Dentro desse horizonte, renovar o projeto pastoral escolar significa compreender que toda iniciativa — seja pedagógica, formativa, espiritual ou social — é uma oportunidade de ajudar os estudantes a descobrir o chamado de Deus para suas vidas.
Inspirados por essa perspectiva, os projetos pastorais podem ser recriados a partir de uma proposta de acompanhamento integral, que favoreça o discernimento pessoal, o protagonismo juvenil e o amadurecimento humano e espiritual. Isso implica sair de uma pastoral meramente sacramental ou voltada a eventos pontuais, para uma pastoral que permeie todas as experiências escolares, desde o ambiente da sala de aula até o intervalo, da escuta cotidiana até os projetos de vida. Cada atividade torna-se lugar de encontro com Deus e espaço de descoberta vocacional: o estudo, o serviço, a convivência, a oração e o compromisso social passam a ser compreendidos como caminhos vocacionais concretos.
Além disso, a visão vocacional da pastoral escolar, inspirada em Francisco, valoriza uma comunidade educativa que caminha unida, que escuta com empatia, que acompanha com paciência e que cultiva a esperança. Essa renovação exige escutar as realidades e inquietações dos jovens, acolher suas perguntas sem medo e propor um ambiente onde se sintam livres para discernir seus próprios caminhos com consciência e responsabilidade. O testemunho dos educadores, a coerência da proposta evangelizadora e a centralidade no amor de Deus são elementos-chave para construir uma pastoral que, verdadeiramente, desperta vocações.
Renovar o projeto pastoral à luz dessa visão é tornar a escola um espaço onde se aprende a viver com propósito, a servir com alegria e a sonhar com um mundo mais justo e fraterno. É assumir que toda ação que promove vida, sentido e comunhão já é, em si, uma ação vocacional. Assim, a pastoral escolar deixa de ser um setor isolado e passa a ser o coração da missão educativa católica: um espaço onde cada pessoa é convidada a escutar o chamado de Deus e a responder com liberdade e amor.
Certamente os educadores e agentes de pastoral são chamados a assumir uma postura de escuta atenta, atualização permanente e presença significativa junto aos estudantes. O primeiro conselho é ser exemplo: testemunhe em sua vida o sentido, a alegria e o compromisso de quem se sente vocacionado, independentemente do caminho escolhido. Jovens se inspiram mais por atitudes concretas do que por discursos, portanto, seja sinal vivo de esperança, acolhimento e autenticidade.
Outro ponto essencial é criar espaços de diálogo aberto e sincero, onde os jovens possam expressar suas dúvidas, sonhos, dores e buscar sentido para suas vidas sem medo de julgamento. Promova rodas de conversa, projetos de vida, encontros de partilha e acompanhamento personalizado, integrando a pastoral ao cotidiano escolar e superando a visão de que vocação diz respeito apenas a escolhas religiosas.
Atualize-se quanto às linguagens e desafios das juventudes de hoje: esteja próximo da realidade deles, valorize a cultura digital, use recursos criativos e esteja atento aos temas que mais lhes tocam, como identidade, justiça social, propósito e espiritualidade. Não tenha receio de abordar temas complexos com empatia e esperança cristã, mostrando que a fé dialoga com todas as dimensões da vida.
É fundamental envolver toda a comunidade escolar no processo vocacional: professores, funcionários, famílias e alunos são convidados a construir juntos um ambiente que valoriza os dons, incentiva o serviço e estimula o protagonismo juvenil. Integre celebrações, experiências solidárias, práticas de cuidado e reflexão disciplinar, para que vocação seja percebida como resposta a Deus e ao mundo em todas as áreas da existência.
Ao investir na formação humana e espiritual — tanto dos educadores quanto dos estudantes — abre-se espaço para a construção de uma escola que inspira liberdade, discernimento e compromisso com o bem comum. Renove sempre seu entusiasmo e busque, com humildade, ser ponte entre as perguntas dos jovens e o chamado amoroso de Deus, fazendo da escola um terreno fértil onde vocações possam florescer e transformar realidades.
A vocês, estudantes eu gostaria de dizer: nunca tenham medo de sonhar grande e de escutar, no mais íntimo do coração, o chamado de Deus para a vida de vocês. Em tempos de incertezas, saibam que cada um é amado, desejado e chamado por Deus a uma existência plena de sentido. Os caminhos nem sempre serão claros e retos, mas tenham confiança: é nas dúvidas, nas buscas e até nas quedas que amadurecem as grandes descobertas. Permitam-se sonhar, confiar nos próprios talentos e cultivar a esperança, pois cada um carrega dentro de si uma missão única, algo só seu para oferecer ao mundo.
Procurem escutar com atenção a voz de Deus e também as inquietações sinceras que brotam do coração. Dialoguem com educadores, amigos e familiares, partilhem suas dúvidas, e estejam abertos a aprender com tudo e com todos. Lembrem-se de que vocação não é só uma decisão para o futuro, mas um caminho vivido dia após dia, em cada escolha de generosidade, de serviço e de fidelidade aos próprios valores. A felicidade verdadeira nasce quando unimos nossos sonhos ao desejo de fazer o bem, de transformar realidades e de servir com alegria onde estivermos.
Enfim, confiem que Deus caminha ao lado de vocês, sem jamais abandonar, sempre renovando a esperança e derramando Seu amor. O mundo precisa do entusiasmo de vocês, de seus dons e da coragem para construir um futuro novo. Sejam protagonistas da própria história e não tenham medo de buscar respostas, pois é ao longo desse caminho que descobrimos quem realmente somos e para que fomos chamados. Que o Espírito Santo ilumine cada etapa da caminhada de vocês, fortalecendo o desejo de construir uma vida cheia de propósito, amor e esperança.
Pe. Guilherme Junior
Presbítero da Diocese de Coxim – MS. Mestrando em Teologia Sistemático-Pastoral pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – RJ; Mestrando em Direito Canônico pelo Instituo Superior de Direito Canônico de Goiânia – GO. Possui especialização em Direito Matrimonial e Processual Canônico (2023) e especialização em Cristologia (2021) pelo Claretiano Centro Universitário . Possui graduação em Filosofia pela Universidade Católica Dom Bosco (2011); graduação em Teologia pelo Instituto Teológico João Paulo II, filiado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2015), convalidado pelo Centro Universitário de Maringá (2015). Atualmente é assessor da Comissão Episcopal para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada (CMOVIC); assessor da Comissão Especial para a Comunhão e Partilha e assessor da Comissão Especial para os Bispos Eméritos, ambas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Para busca pelas associadas, utilize a ferramenta diretamente na página Associadas
Para as demais buscas no site, use palavras-chave que facilitem sua busca. Não é necessário utilizar conectivos, artigos ou conjunções. Ex: “seminário mantenedoras” em vez de “seminário de mantenedoras”